24 março, 2011

ESPIRITUALIDADE (MEIO AMBIENTE)


Diversas religiões e tradições espirituais tem se manifestado sobre a crise ambiental que ameaça a vida no planeta.
Segue abaixo uma seleção de textos que confirmam a existência de uma teologia ambiental, e uma preocupação crescente dessas tradições em ratificar a presença do sagrado nas mais diversas manifestações de vida
“A destruição da natureza resulta da ignorância, cobiça e ausência de respeito para com os seres vivos do planeta.(...) Muitos dos habitantes da Terra: animais, plantas, insetos e até microorganismos que já são raros ou estão em perigo,  podem tornar-se desconhecidos das futuras gerações. Nós temos a capacidade, nós temos a responsabilidade. Nós precisamos agir antes que seja tarde”.
Sua Santidade, o Dalai Lama; “Uma Abordagem Ética da Proteção Ambiental”
João Paulo II, muitas vezes apelidado de "O Papa Ambientalista" questiona: "como ficar indiferentes diante das perspectivas dum desequilíbrio ecológico, que torna inabitáveis e hostis ao homem vastas áreas do planeta?". E acrescenta: "É urgente uma educação sobre a responsabilidade ecológica... O tema da proteção do Ambiente merece uma extrema atenção e reveste-se verdadeiramente de uma altíssima importância no momento atual da história e do desenvolvimento do nosso mundo moderno".
(Pastoral da Ecologia e do Meio Ambiente /SP; Leia “COMPROMISSOS DA PASTORAL DA ECOLOGIA”)

“Há chance de salvamento. Mas para isso devemos percorrer um longo caminho de conversão de nossos hábitos cotidianos e políticos, privados e públicos, culturais e espirituais. A degradação crescente de nossa casa comum, a Terra, denuncia nossa crise de adolescência. Importa que entremos na idade madura e mostremos sinais de sabedoria. Sem isso, não garantiremos um futuro promissor”.
(Leonardo Boff, “Saber Cuidar”, Editoras Vozes, página 17)
“A Terra produziria sempre o necessário, se com o necessário soubesse o homem contentar-se. Se o que ela produz não lhe basta a todas as necessidades , é que ele a emprega no supérfluo o que poderia ser empregado no necessário”.
(Livro dos Espíritos; Allan Kardec,capítulo V, da Lei de Conservação)

“Toda Sexta-feira à noite começa o Shabat para a tradição judaica. Shabat é o conceito que propõe descanso ao final do ciclo semanal de produção, inspirado no descanso divino no sétimo dia da Criação. Muito além de uma proposta trabalhista, entendemos a pausa como fundamental para a saúde de tudo o que é vivo. A noite é pausa, o inverno é pausa, mesmo a morte é pausa. Onde não há pausa, a vida lentamente se extingue. Para um mundo no qual funcionar 24 horas por dia parece não ser suficiente, onde o meio ambiente e a terra imploram por uma folga, onde nós mesmos não suportamos mais a falta de tempo, descansar se torna uma necessidade do planeta” (...).
(“Os domingos precisam de feriados”, rabino Nilton Bonder)

“Que o nosso tempo seja lembrado pelo despertar de uma nova reverência face à vida, por um compromisso firme de alcançar a sustentabilidade, pela rápida luta pela justiça e pela paz, e pela alegre celebração da vida”.
(Carta da Terra , Paris, março de 2000)
Água na Bíblia: texto de Maria Inês Carniato, Bacharel em Filosofia, Mestra em Teologia, e especializada em Comunicação,é autora de livros didáticos de Ensino Religioso, na área de Diálogo inter-religioso e Ecumenismo.
Atualmente é diretora de redação da revista Diálogo de Ensino Religioso.

03 março, 2011

Ecologia e Espiritismo

É urgente que o movimento espírita absorva e contextualize, à luz da doutrina,
os sucessivos relatórios científicos que denunciam a destruição sem precedentes dos
recursos naturais não renováveis, no maior desastre ecológico de origem antrópica da
história do planeta. Os atuais meios de produção e de consumo precipitaram a humanidade
na direção de um impasse civilizatório, onde a maximização dos lucros tem justificado o
uso insustentável dos mananciais de água doce, a desertificação do solo, o aquecimento
global, a monumental produção de lixo, entre outros efeitos colaterais de um modelo de
desenvolvimento “ecologicamente predatório, socialmente perverso e politicamente
injusto”.
Na pergunta 705 do Livro dos Espíritos, no capítulo que versa sobre a Lei de
Conservação, Allan Kardec pergunta: “Porque nem sempre a terra produz bastante para
fornecer ao homem o necessário?”, ao que a espiritualidade responde: “É que, ingrato, o
homem a despreza! Ela, no entanto, é excelente mãe. Muitas vezes, também, ele acusa a
Natureza do que só é resultado da sua imperícia ou da sua imprevidência. A terra produziria
sempre o necessário, se com o necessário soubesse o homem contentarse”
(...).
É evidente que em uma sociedade de consumo, nenhum de nós se contenta
apenas com o necessário. A publicidade se encarrega de despertar apetites vorazes de
consumo do não necessário daquilo
que é supérfluo, descartável, inessencial renovando
a cada nova campanha a promessa de felicidade que advém da posse de mais um objeto,
seja um novo modelo de celular, um carro ou uma roupa. Para nós espíritas, é fundamental
que o alerta contra o consumismo seja entendido como uma dupla proteção : ao meio
ambiente que
não suporta as crescentes demandas de matériaprima
e energia da
sociedade de consumo, onde a natureza é vista como um grande e inesgotável
supermercado – e ao nosso espírito imortal, já que, segundo a doutrina espírita, uma das
características predominantes dos mundos inferiores da Criação é justamente a atração pela
matéria. Nesse sentido, não há distinção entre consumismo e materialismo, e nossa
invigilância poderá custar caro ao projeto evolutivo que desejamos encetar . Essa questão é
tão crucial para o Espiritismo, que na pergunta 799 do Livro dos Espíritos, quando Kardec
pergunta “de que maneira pode o Espiritismo contribuir para o progresso?”, a resposta é
taxativa: “Destruindo o materialismo, que é uma das chagas da sociedade.(...)”
Uma das mais prestigiadas organizações não governamentais do mundo, o
Worldwatch Institute, com sede em Washington, divulga anualmente o relatório “Estado do
Mundo”, uma grande compilação de dados e estudos científicos que revelam os estragos
causados pelo atual modelo de desenvolvimento. Na última versão do relatório, referente ao
ano de 2004, afirmase
que “o consumismo desenfreado é a maior ameaça à humanidade”.
Os pesquisadores do Worldwatch denunciam que “altos níveis de obesidade e dívidas
pessoais, menos tempo livre e meio ambiente danificado são sinais de que o consumo
excessivo está diminuindo a qualidade de vida de muitas pessoas”.
Aos espíritas que mantém uma atitude comodista diante do cenário descrito
nessas breves linhas, escorados talvez na premissa determinista de que tudo se resolverá
quando se completar a transição da Terra ( de mundo de expiações e de provas para mundo
de regeneração) é bom lembrar do que disse Santo Agostinho no capítulo III do Evangelho
Segundo o Espiritismo. Ao descrever o mundo de regeneração, Santo Agostinho diz que
mesmo livre das paixões desordenadas, num clima de calma e repouso, a humanidade ainda
estará sujeita “às vicissitudes de que não estão isentos senão os seres completamente
desmaterializados; há ainda provas a suportar (...) e que “nesses mundos, o homem ainda é
falível, e o Espírito do mal não perdeu , ali, completamente o seu império. Não avançar é
recuar , e se não está firme no caminho do bem, pode voltar a cair nos mundos de expiação,
onde o esperam novas e terríveis provas”. Ou seja, não há mágica no processo evolutivo:
nós já somos os construtores do mundo de regeneração, e , se não corrigirmos o rumo na
direção do desenvolvimento sustentável, prorrogaremos situações de desconforto já
amplamente diagnosticadas.
Não é possível, portanto, esperar a chegada do mundo de regeneração de braços
cruzados. Até porque, sem os devidos méritos evolutivos, boa parte de nós deverá retornar
à esse mundo pelas portas da reencarnação. Se ainda quisermos encontrar aqui estoques
razoáveis de água doce, ar puro, terra fértil, menos lixo e um clima estável sem os
flagelos previstos pela queima crescente de petróleo, gás e carvão que agravam o efeito
estufa – deveremos agir agora, sem perda de tempo.
Depois que a ONU decretou que 2003 seria o ano internacional da água doce, os
católicos não hesitaram em, pela primeira vez em 40 anos de Campanha da fraternidade,
eleger um tema ecológico: “Água: fonte de vida”. Mais de 10 mil paróquias em todo o
Brasil foram estimuladas a refletir sobre o desperdício, a poluição e o aspecto sagrado desse
recurso fundamental à vida. E nós espíritas? O que fizemos, ou o que pretendemos fazer? O
grande Mahatma Gandhi que
afirmou certa vez que toda bela mensagem do cristianismo
poderia ser resumida no sermão da montanha – nos serve de exemplo, quando diz “sejamos
nós a mudança que nós queremos ver no mundo”.

André Trigueiro